terça-feira, 12 de abril de 2016

Minha Belle Époque

Minha infância foi daquelas clichês-não-clichês, sendo uma típica garotinha de roça, de sítio, de subir em árvores, ralar os joelhos, de ficar sem o tampão do dedão do pé, de usar botinas para correr na lama, de se cobrir de argila, de comer fruta direto do pé, de tomar banho de rio e de ser feliz.
Era uma casinha no topo da montanha, como nos filmes, porém melhor (muito melhor!).
Me lembro de cada detalhe de minha infância nada conturbada, do jatobazeiro onde utilizávamos da sombra para acampar, de um rio extremamente raso em que atravessávamos uma pontezinha, da plantação de amoras que eu e meu pai demos início, da tirolesa que montamos assim que começamos a construir a casa, de uma pseudocasadaárvore, do balanço que insistíamos em reconstruir toda vez que alguém rompia sua corda, do monte de areia em que as crianças costumavam dar vida à sonhos (Surgiram ali princesas, castelos, lagos, imaginação), dos vizinhos -amigos e família, da caverna que levávamos todos os amigos para visitar -fruto de cada vez mais mitos, da cidadezinha próxima onde todas as visitas se faziam presentes, e o que mais me aperta o coração nas lembranças... A vista do topo da montanha, aquele pôr-do-sol encontrado somente ali naquele cantinho específico, o ponto perfeito para as estrelas cadentes que apareciam nas madrugadas de domingo.
Sinto falta da época em que as coisas eram mais fáceis, a natureza estava junto à nós e não existiam maiores preocupações, e todo ano enquanto o natal se aproxima, me faço fonte, fonte de nostalgia e saudade. Saudade dos tios que se fantasiavam e juravam descer pela lareira para a alegria dos pequenos. Saudade dos presentes trocados exatamente à meia noite. Saudade do abraço coletivo antes da ceia, feita no fogão à lenha. Saudade da criança que se via feliz com aquele pouco, com o balanço de uma madeira, com os modões que tocavam cada dia mais alto no rádio da cozinha, com a água gelada do chuveiro externo, com a sala de vidro que nos despertava junto ao Sol, com o tempo de terra, barro e argila.
Há um tempo o tempo passou, pois sempre passa. Mas dizem que lembranças e nostalgias servem para revivê-los, portanto que assim seja, e que revivamos a saudade do tempo bom. 

Caro passado...

(Sobre um alguém que decidiu não ouvir o mundo em volta -Isso inclui minha pessoa- e perdeu seu passado para o presente. Indico - You know I'm no good)


Aquele sorriso reluzente aberto na maior parte do tempo, lindo, daqueles que os olhos semicerram quando aberto, lindo, dos quais roubam um seu quando aparecem, lindo, daqueles que ficam em sua mente quando a tal distância aparece. Lindo, o qual não soube valorizar. E hoje vejo aquele sorriso lindo sendo causado por outra, por ela que apareceu sem aviso prévio e roubou o coração de quem costumava deixá-lo sempre guardado, muito bem escondido por sinal.
Eu o amei, eu o amo, como devia ter amado enquanto estava comigo, como devo amar pelo fato de estar feliz (mesmo não sendo comigo). Costumava chamá-lo de "Rei das Peculiaridades", zombava de seus gostos um tanto quanto diferentes, o que me fez demorar a perceber que era exatamente o que fazia dele, ser ele. Onde já se viu um alguém gostar tanto de groselha? Ou assistir treze vezes o mesmo filme procurando erros de gravação? Por que todas as manhãs precisava se alongar ao som de uma música nova? Por que ria tanto de piadas de pontinhos? Eram tantas perguntas diárias, cujas respostas me faziam revirar os olhos, já que a zona de conforto é uma senhora traíra e uma vez colocados lá, jamais saímos sem feridas ou rancor. Hoje, me aninho no sofá com um outro, sentindo falta de seus papos aleatórios sobre a música que ouviu nessa manhã, sinto falta do amor selvagem, entregue pelas correntes metafóricas de suas mãos muito bem vividas. E passo todas as noites imaginando como seria se eu tivesse percebido que a vida é leve, que ele era leve como nossas manhãs brincando com o travesseiro, como nossas piadas sobre a roupa íntima um do outro. O remorso bate e não me vejo sem o medo de descobrir que ela o faz feliz, e que bebe seus drinks malucos de groselha para agradá-lo e que assiste todas as vezes os filmes somente para se divertir com aquela expressão engraçada que fazia observando o cenário e os figurantes de cada cena.
Mais um sorriso se abre à minha frente, e pela centésima vez, não. Não é tão iluminado quanto o dele, tampouco tão "contagiante" e o que esqueci de citar (talvez porque só lembre durante a noite, enquanto sua imagem vagueia por meus pensamentos de um modo sutil) não possui as covinhas que tanto gostava. E mesmo com o outro, posso encontrar um alguém sem defeitos ou algo do tipo, e ainda não serei feliz, afinal, não é ele. Não é o moço que ri de piadas ruins, nem o moço que fala mal das minhas calcinhas mais confortáveis.
O tempo me ensinou a valorizar as pessoas, e talvez, um dia eu pare de buscar nos sorrisos, a essência dele e acabe reencontrando a minha.


Com amor,
Um alguém que aprendeu a amar o passado.